Você por acaso acredita que problemas atuais, como traumas, angústias e medos têm raiz no passado? Acredita que o meio de saná-los é revirar as memórias, retornar à infância, compreender a influência dos pais e os “recalques” do tão superestimado “inconsciente”?
A leitura deste artigo será sumamente útil para que conheça precisamente o que faz os problemas acontecerem e o que precisamente faz o psicoterapeuta quando aplica uma técnica que conduz o paciente da melhora à remissão completa.
Direta ou indiretamente influenciadas pela psicanálise, a imensa maioria das pessoas quando pensam a respeito de seus problemas logo acreditam que o grande meio de resolver suas questões será descobrir a raiz, a “causa”, onde tudo começou, como se houvesse uma espécie de débito pendente, um elo mal resolvido entre presente e passado. Consoante essa crença, pouco razoável e bastante anticientífica, estimam que u manejo terapêutico tenha como premissa básica a investigação dos verdadeiros fatos, tal como um inquérito policial, para juntar peças de um quebra-cabeças que se espalham como destroços de um desastre à deriva num infindável oceano.
Se isto fosse verdade, faria todo sentido que a terapia durasse anos e anos, ocorrendo entre chutes, análises, a testagem de infinitas combinações em busca de uma tão sonhada fenda no solo do inconsciente para que dali o analista possa receber o material e buscar os encaixes reconstitutivos… e em meses de buscas de tanta complexidade, observa-se pouca ou nenhuma melhora. Sim, isto faria sentido, mas felizmente tal premissa não é verdadeira.
O inconsciente como déspota, algoz e fonte das angústias não é mais o campo onde se presume que floresçam os problemas. Na realidade, está muito bem estabelecido cientificamente que muitos deles são aprendidos como comportamentos mentais, meros jeitos de pensar: o modo como se interpreta uma situação, de como a classifica, faz disparar os mecanismos que causam estados de ansiedade, aflição e angústia acentuados, e o paciente vê-se sufocado em raciocínios inconclusivos e, naturalmente, deprime-se.
A prova de que não há no passado a causa do que se sofre no presente é a facilidade com que um terapeuta cognitivo ou mesmo um hipnólogo conseguem viabilizar comportamentos novos, novas sensações e dessensibilizações em fração de minutos. Não existe em cada ato de pensar um “escaneamento” das imagens passadas para determinar o que se sente no presente. Não há ligação direta com uma “causa” passada. É simplesmente o presente quem define o presente e será possível sentir mil coisas diferentes sobre o mesmo objeto-problema conforme a maneira como se pensa. Só depende do contexto, de quem fala, dos acontecimentos do próprio dia em que se está.
A influência do passado está precisamente nos comportamentos mentais aprendidos em épocas passadas, que pode terem sido adotados em um momento de pouca reflexão ou que eram perfeitamente adequados a seu contexto na ocasião específica, mas o sujeito não percebeu que podia ou devia optar por outro pensamento ou reformá-lo logo depois, em um background diferente. Sendo assim, alguém que na infância não queria apresentar-se na formatura e por nervosismo tenha sofrido um vômito, aprende inconscientemente a provocar vômito nas próximas situações das quais desejaria se livrar e com o passar dos anos esquece-se de “desaprender”, de desabilitar esse dolorido, mas útil recurso. Poderá provocar náuseas de uma maneira incontrolável ao longo da vida simplesmente por não ter reaprendido a não contrair o abdome – e inclusive pode nem saber que contrai. Só conhece os sintomas, e do resto nada lembra.
Temos aqui uma ação inconsciente e não do inconsciente. Este não é uma força, uma inteligência, um outro eu. Por “inconsciente” simplesmente podemos compreender os processos mentais que executamos e não percebemos; e a maioria dos processos inconscientes quando se tornam conscientes, através de uma explicação do terapeuta ou de um breve exercício, na maioria das vezes podem ser controladas, inibidas ou potencializadas, conforme o interesse do paciente, o dono desse organismo.
Freud foi um homem de seu tempo. Deixou-se encantar pelo fenômeno de conversão de energia e viu com seus próprios olhos o poder da pressão. Supôs, por analogia, que dentro do homem existem forças que, se forem reprimidas, forçam os alicerces do comportamento e do bem-estar. Desse modo, a análise cuidadosa do terapeuta deveria promover uma espécie de despressurização das forças inconscientes, para que elas sejam liberadas sem prejuízos emocionais ao indivíduo. Está assim estabelecido o modelo hidráulico da emoção.
Um terapeuta moderno, não-freudiano e que ancora seu trabalho em evidências acadêmicas, entenderá que a proposta de Freud surtirá efeito não pelas razões que o médico austríaco teorizava, mas porque à medida em que o paciente repete inúmeras vezes o seu problema perante o terapeuta, oferece condições de reelaborar suas próprias opiniões. Funciona, mas se a premissa se tornar diretamente cognitiva e comportamental ao invés de “hidráulica”, os resultados já se apresentam na primeiríssima sessão, indo direto ao assunto e permitindo a ambos, terapeuta e cliente, estabelecerem precisamente como desmontar os problemas, como reaprender o correto por cima do desajustado e em quanto tempo se concluirá o tratamento.
Com a abordagem cognitiva, o cliente psicoeducado compreende que o importante é o mal que se sente hoje (o passado já passou e o futuro nem existe), e que pode determinar imediatamente se vai se sentir mal ou bem. O jeito de posicionar o pensamento determinará a reação nervosa, química, que ocorrerá nos recônditos do sistema nervoso. Técnicas como a estimulação recíproca (pensar o problema após uma série de relaxamentos ou ser exposto a questão enquanto recebe estímulos agradáveis por estar fazendo algo prazeroso), a dessensibilização sistemática ou flooding demonstram-se eficazes e velozes em respostas. Por tudo isso, o terapeuta geralmente trata dos problemas em separado. Um de cada vez. E a terapia tende a ser muito breve.
Vale a pena considerar que há terapeutas e terapeutas. Existem os cognitivos bons, e os nem tão bons. Procure buscar referências junto a parentes e amigos que visitaram um profissional franco, culto, perspicaz e dedicado que mantém seu interesse na recuperação breve e duradoura de seus pacientes, usando das mais modernas e testadas frentes de intervenção.
A psicoterapia, certamente, é um sacerdócio paralelo que devolve vida ao ser vivo. Nunca desista de triturar seus problemas e menos ainda de encontrar um bom profissional. Que Deus dê longa vida a quem trabalha com o que gosta e fornece generosamente os melhores frutos que produz.