ESPÍRITOS EM MEU QUARTO? – entenda as alucinações

Leitora: Ingrid Lechner
(Mongaguá – SP)

“Tive uma visão, a única que tive em minha vida, estou com 37 anos de idade. Lembro-me que não tinha dez anos ainda, e sei também a data pois era véspera do meu aniversário. Estava eu deitada, de noite, em meu quarto, não sei se já dormira, quando olho e vejo na escuridão uma porção de rostos de homens feios, cobertos de feridas que me olhavam acusadoramente. Naturalmente fiquei apavorada, sentei-me na cama e não me atrevia nem mesmo a gritar chamando meus pais.

Em seguida entra meu pai no quarto, isto realmente, e viera para colocar um presentinho no criado-mudo para quando acordasse de manhã cedo e visse logo o presente de aniversário. Meu pai vendo que estava acordada ainda me disse para dormir. Depois que meu pai saiu, desapareceram também aqueles rostos disformes. Tenho certeza que não foi sonho, apesar de naquela época ter sido uma criança e gostaria que os senhores me explicassem isto. Na mesma época eu matara um dia um passarinho passando por cima dele com meu carro de brinquedo, pelo simples gosto de matar (isto é comum em crianças) e meus pais me repreenderam. E, de noite vi um rosto que me olhava acusadoramente, um rosto esquisito, cor de abóbora, olhos pretos rodeados por um círculo branco, que me espiava de um lado da minha cama. Aí gritei e chamei minha mãe, desvanecendo-se assim a visão. Depois, nunca mais vi nada. Pode ser que os pensamentos de medo, de remorso tenham feito surgir aquela visão na minha mente de criança, depois de ter judiado do passarinho. Mas, não encontro explicação para todos aqueles rostos apavorantes que vi numa outra noite”.

 

Resposta por Pablo Garulo (parapsicólogo da equipe do CLAP – Centro Latino-Americano de Parapsicologia, dirigido pelo padre Quevedo S.J.):

As alucinações podem se manifestar em todos os domínios da atividade sensorial. Encontramos alucinações visuais, auditivas, olfativas, gustativas, cenestésicas, da sensibilidade geral, genitais, multissensoriais…

Quando as alucinações se traduzem em impressões vagas e indiferenciadas são chamadas de elementares (resplandores, luzes, barulhos, fulgores, murmúrios indefinidos…). Quando se identificam com objetos precisos (animais, personagens, palavras claras, músicas, cheiros definidos, etc.) são chamadas de complexas ou figuradas.

As alucinações podem ser positivas ou negativas. Nas alucinações positivas se percebe o que não existe lá. Nas negativas não se percebe o que de fato deveria estar impressionando os sentidos.

Apesar da estreita relação existente entre alucinação e ilusão há, porém, uma diferença fundamental: a ilusão não é uma percepção sem base na realidade mas uma deformação da percepção. A ilusão se apoia na realidade, mas transformando-a.

As alucinações, a percepção sem objeto, compreendem um estado psicológico particular, diferente em cada caso concreto.

 

Às vezes não têm significado patológico. No estudo clínico das alucinações deve-se levar sempre em conta não só a intensidade das mesmas, o maior ou menor grau de clareza na percepção sensorial, mas também a qualidade ou conteúdo delas. Não é a mesma coisa perceber claramente um santo, os demônios, animais aterrorizantes ou um ruído, um resplendor, ouvir vozes, músicas ou um cheiro indefinido. Sob esta disparidade oculta-se uma significação que não pode ser negligenciada. O que o médico procura é desvendar, atrás das aparências sensoriais, a tendência, a significação oculta e as causas psicológicas ou psicofisiológicas das alucinações.

 

Alucinações visuais – Podem ser reproduzidas experimentalmente em circunstâncias favoráveis, por isso seu estudo é mais fácil.

A origem deste tipo de alucinação pode ser diversa. Às vezes reproduzem-se em laboratório pela excitação do córtex cerebral. O Dr. Fedor Krause, neurocirurgião de Berlim, fez experiências com um ferido de guerra. Provocando estímulos elétricos sobre a esfera visual ocipitalesquerda, o ferido declarava perceber figuras análogas àquelas do cinema.

O tipo mais comum de alucinações visuais são as chamadas imagens hipnagógicas. Consistem numa aparição que se manifesta no momento do semi-sono ou estado crepuscular.

Em geral, a imagem alucinatória é absolutamente estereotipada: a visão de um ser fantástico, rostos, um olhar familiar, etc. Quase sempre o paciente as reconhece como alucinações, sabe que está sendo enganado pelos sentidos.

A visão frequentemente é instantânea ou extremamente curta, e também frequentemente acompanhada de um sentimento de angústia. Em regra, repete-se com frequência e pode ser ate quotidiana.

Existem numerosas descrições de como se produz a visão hipnagógica típica:”A imagem aparece frequentemente sem eu estar prevenido de sua iminência nem de sua qualidade; com a mesma rapidez esta se afasta para ser substituída por outra… Eu tenho como uma máquina de fotos no cérebro. Ele funciona como um autômato, independente de minha vontade… “.

Em pessoas submetidas a uma prolongada vigília, a sonolência provoca imagens hipnagógicas. Nos campos de batalha, quando os soldados são forçados a passar vários dias sem dormir, são frequentes as perturbações deste gênero.

Uma modalidade pitoresca de alucinação visual é a liliputiense. O alucinado percebe um mundo de personagens diminutos semelhantes aos de Gulliver no País das Maravilhas. O paciente chega a regozijar-se com este pequeno mundo, achando-o divertido. Os pequenos animais ou homens em miniatura que se oferecem à vista do alucinado não só parecem estranhos por suas pequenas dimensões que contrastam com as coisas do mundo exterior, mas podem também ser notáveis por sua coloração, gestos, atitudes e comportamento engraçado.

 

Visões liliputienses têm sido também assinaladas entre os pseudo-misticos soba forma de minúsculas representações do céu e dos bem-aventurados: céu diminuto e pequenos santos!

Quaisquer tipos de alucinações, inclusive as liliputienses têm sido observadas em pessoas que aparentam boa saúde. Parece, porém que a senilidade forma uma condição especialmente favorável para os diminutos fantasminhas… também são bastante comuns no curso de intoxicações exógenas e especialmente do alcoolismo sub-agudo.

Os traumatismos cerebrais das últimas guerras possibilitaram inúmeras comprovações de alucinações visuais. Um soldado ferido na região occipital esquerda, quinze meses mais tarde, começou a ter crises caracterizadas pela aparição de luzes brilhantes e intermitentes. Estas crises foram seguidas de outras acompanhadas de alucinações complexas, em movimento, vivas, representando cenas vividas pelo ferido e que haviam-no impressionado fortemente.

 

O Delirium Tremens é uma outra situação propícia à alucinação visual. O alcoólatra, em delírio, crê perceber formas em movimento, silenciosos seres estranhos, animais bizarros, que podem se apresentar com os detalhes mais realistas. As formas esquisitas parecem ameaçar o paciente, confundindo-o ao ponto de desorientá-lo e aterrorizá-lo.

Outros sentidos como o ouvido e o olfato também podem ser alucinados. A combinação de diversas alucinações provoca no sujeito um sentimento de realidade total, tão intenso que o alcoólatra pode chegar ao desespero.

 

Alucinações auditivas – São tão frequentes quanto às visuais, combinando-se às vezes com estas. Principalmente nas intoxicações, mas podem ocorrer, como toda alucinação, em circunstâncias aparentemente normais.

Realizaram-se experiências em laboratório para provocar alucinações auditivas.

Por exemplo, esfriando com cloruro etílico a circunvolução cerebral correspondente à audição num mutilado cujo ferimento permitia uma ação direta sobre o cérebro, vozes estranhas eram ouvidas pelo paciente.

Em pessoas submetidas à eletrização da parte posterior temporal, ou excitando zonas cerebrais correspondentes à audição, tem-se produzido alucinações verbais ou inclusive de complexas “peças” musicais.

Nas alucinações auditivas verbais o que o doente percebe não é outra coisa que sua “linguagem” interior. E “ouvir de dentro para fora”. Mas com a característica toda especial de que o alucinado não reconhece como própria sua “linguagem”, não conseguindo identificá-la como proveniente de seu Eu pessoal.

Esta não-identificação da “linguagem” interna leva o paciente, em muitos casos a atribuir visos de realidade à alucinação auditiva, acreditando ser dos espíritos dos mortos, Deus, o diabo ou qualquer entidade sobrenatural a causa ou a origem destas audições. O doente, então, julga-se um “escolhido”, um “profeta” ou um médium” em diálogo constante com o “além”.

As pessoas que sofrem deste tipo de alucinações, salvo exceções, manifestam profundas perturbações da personalidade, geralmente de desagregação psíquica, de dissociação dos laços que garantem a unidade do Eu.

 

Alucinações do gosto e do olfato – São, em geral, muito elementares e monótonas: sabor ou cheiro de algo queimado, de peixe, de matéria fecal, gostos ou odores acres, repulsivos, etc. Jogam um papel particularmente importante no desenvolvimento das idéias de perseguição. Suscitam idéias de envenenamento, de rechaço dos alimentos.

Nos casos de alcoolismo ou nas neuroses e psicoses de perseguição, tornam-se particularmente penosas.

 

As mais diversas causas – As causas das alucinações são muito diversas. Umas originadas por traumatismos: lesões cerebrais, golpes na cabeça, mutilação, pressões em alguma região cortical… Outras, por intoxicações do organismo provocadas por álcool ou por substâncias alucinógenas: L.S.D., mescalina, ácido lisérgico, peiote mexicano, cocaína, etc. Todavia, sabe-se que certas neuroses e psicoses vão acompanhadas de frequentes alucinações, e isto indica que desequilíbrios psicológicos, perturbações mentais e a demência estão também na base de falsas percepções. Estados de fadiga física ou mental são também causa frequente de uma alucinação.

Fora as causas específicas, cujo diagnóstico dependerá de cada caso concreto, o ambiente sócio-cultural e religioso determina certas formas alucinatórias. Temos assim, as alucinações dos endemoninhados ou as que acompanham a prática do espiritismo.

 

Alucinações dos endemoninhados– Sempre insistimos nesta Revista [*] que o endemoninhado é, antes de mais nada, um doente.

Os grandes casos de endemoninhamento na história mostram que os protagonistas eram mais ou menos desequilibrados, sofrendo alucinações da índole mais diversa. Basta examinar alguns depoimentos para ficarmos convencidos do desequilíbrio dos mal chamadas endemoninhados.

O Pe. Surin, exorcista e “endemoninhado” de Loudun, assim escrevia: “Estou em conversa perpétua com os diabos… de três meses e meio para cá, eu nunca passei um dia sem ter o diabo a meu lado em exercício. O diabo passa do corpo da pessoa possessa e entrando no meu me agita e me atravessa visivelmente durante várias horas…”. Surin tentou suicidar-se e foi considerado, nos registros de sua ordem religiosa, como um enfermo mental.

O mais notável nas “pseudo-possessões” demoníacas é a violência, a diversidade e a impetuosidade das alucinações. Os pacientes vêem, sentem, cheiram, ouvem e obedecem ao “demônio”!

Entre as alucinações de tipo demoníaco se destacaram pela sua vivacidade as da esfera genital: os famosos íncubos e súcubos. O alucinado pensava estar em contato sexual com demônios machos ou fêmeas. Estes delírios sexuais foram mais frequentes em ambientes onde existia grande repressão ao sexo.

 

Alucinação em ambiente espírita – Entre os perigos para a saúde física e mental que a prática do espiritismo encerra, os delírios alucinatórios são um dos sintomas mais frequentes.

A crença na comunicação com os espíritos dos mortos dispara os mecanismos da auto-sugestão que estão na base das mais diversas alucinações.

O médium, sentindo-se invadido pelo “espírito do morto”, chega a vê-lo, conversa com ele, escuta as mensagens que o espírito lhe comunica; dramatiza, enfim, um relacionamento irreal que com toda propriedade pode ser chamado de alucinatório, isto é, sem base na realidade.

Em todos os casos, uma análise psicológica destas falsas comunicações com os espíritos revela que seu conteúdo não é mais do que a manifestação dramatizada das idéias, afetos, tendências e desejos da personalidade do médium ou se fazendo eco do ambiente em que vive.

Uma percepção paranormal pode estar na base de uma alucinação sensorial.

 

O sentimento mais ou menos confuso de que algo de ruim tem acontecido, captado parapsicologicamente, pode manifestar-se por meio de uma dramatização do inconsciente, sob a forma de alucinação visual, auditiva  e etc. Não deve confundir-se a alucinação com a fantasmogênese, ecto-colo-plasmia, aporte, fotogênese, psicofonia e tantos outros fenômenos parapsicológicos. Nestes casos, a visão, audição, ou qualquer outra impressão dos sentidos é real, corresponde a objetos externos reais.

 

As imagens hipnagógicas são o tipo mais comum de alucinações visuais: seres fantásticos, rostos, um olhar familiar…

A manifestação freqüente de alucinações pode ser um sintoma patológico indicador de uma personalidade desintegrada.

Entre as alucinações de tipo demoníaco foram notáveis os delírios sexuais, principalmente em ambientes onde existia grande repressão ao tema sexual.

[*] – O presente artigo foi extraído da seção “Diálogo com o leitor” sob o título “Visões alucinatórias” – Revista de Parapsicologia do CLAP, pg. 28, e teologicamente não representa integralmente a opinião do portal Mario Umetsu.

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